Espiritismo  Responde – Os Espíritos Nobres têm falado sobre momentos de transição  que a Terra está passando. O que caracteriza esses momentos?
Divaldo Pereira Franco – São as convulsões sociais que se derivam dos  distúrbios morais. Nesses distúrbios morais-sociais nós geramos uma  psicosfera doentia. Fala-se de que a ecologia está alterada, a nossa  atmosfera está carregada de gases destrutivos, de que estamos vivendo  momentos em que a água vai entrar em escassez, porque apenas 2% da água  do mundo são potáveis.. Fala-se tudo isso, e mais das tsunames, das  erupções vulcânicas... Tudo isso faz parte de um grande conjunto que  constitui a transição.
Realmente, a nossa mente transformada em instrumento de prazer, de  violência gera também convulsões geológicas. A mudança e a sustentação  das placas tectônicas que produzem esses tremendos maremotos, essas  tsunames podem também ser provocadas pelos distúrbios mentais dos  habitantes do planeta.
A Terra tem que se transformar do ponto de vista geológico para albergar  Espíritos mais elevados. Há uma evolução correspondente do planeta, ao  mesmo tempo que ocorre a sociológica, moral, produzindo outras  variantes. Se reflexionarmos em torno da sociedade como um todo, vemo-la  terrivelmente fragmentada.
Observemos, por exemplo, as religiões. As doutrinas religiosas, ao invés  de marcharem para a união, avançam para a competição, odeiam-se  reciprocamente, em nome de Deus que é todo amor. É um paradoxo!
A política é cada dia mais arbitrária. A sede de dominação e de  totalitarismo continua no Mundo de hoje, como no tempo mais recuado da  nossa vida na antigüidade oriental. As propostas de natureza sociológica  não saem do papel, quase nunca são aplicadas.
A violência urbana toma conta do mundo. Por que? Porque o indivíduo é  violento. Então, a cura, a terapêutica, será, infelizmente essa grande  mudança que se está dando mediante a dor, impondo-nos a transformação  espiritual através da nossa modificação interior.
Muitos dizem: “Nós necessitamos de leis justas”. A maioria das leis é  elaborada dentro dos códigos da justiça, mas essas leis feitas e  aplicadas a pessoas violentas e viciosas, favorecem a impunidade, a  eleição do poderoso em detrimento daquele que é fraco. É necessário  trabalhar-se o indivíduo, como disse Allan Kardec, sendo hoje melhor do  que ontem, amanhã melhor do que hoje e lutando sempre contra as suas más  inclinações.
ER – Apesar dos momentos difíceis que a Humanidade está vivenciando,  vemos um número muito grande de pessoas indiferentes ao que está  acontecendo, sem religiosidade, sem solidariedade, simplesmente deixando  a vida passar. Quais são as conseqüências dessa passividade? O que será  capaz de despertá-las?
Divaldo – A dor é o clarim que nos desperta a todos. No estudo da psicologia, nos vários níveis da evolução da consciência, a primeira fase é a chamada de consciência de sono. A pessoa é apática emocionalmente. Pode possuir muita inteligência, muito conhecimento, mas é indiferente ao que acontece com os outros. É uma consciência adormecida, egóica, somente se interessando pelo que é seu, enquanto que os outros não têm nenhum sentido no conjunto social.
Esta é uma fase da evolução, porque logo depois passa-se à consciência  desperta. Mas, isso ocorre através do sofrimento. Esse indivíduo sempre  pensa que a morte, a miséria, o câncer apenas atacam o vizinho. Mas,  como o vizinho pensa a mesma coisa, vai chegar a vez dele ser atacado,  aí então ele desperta e exclama: “Por que Deus fez isso comigo? Por que  eu?”
É comum sempre perguntar-se: “Mas, por que comigo?” A pergunta deveria  ser: “Por que não comigo?” Porque todos somos iguais. Todos  experimentamos as mesmas vicissitudes. Por que uns sim e outros não?  Então essas pessoas apáticas, indiferentes, serão sacudidas como estamos  sendo todos, pelos sofrimentos: a depressão, o distúrbio do pânico, as  inquietações, o vazio existencial, os cânceres e tantas outras  enfermidades.
Mantendo-se essa indiferença, a mesma revela um transtorno patológico. O  indivíduo já não tem sensibilidade, o que é uma das primeiras  características da depressão, graças à falta de serotonina e de  noradrenalina. A pessoa que está indiferente, não tem afeto pelos seres  antes mais amados... Essa depressão hoje é de natureza pandêmica.
ER – Numa atitude muito feliz, você lançou a campanha “Você e a Paz”.  Como está essa campanha? Já é possível identificar os resultados?
Divaldo – Sim, e quase que de imediato No ano atrasado, tivemos uma  emoção incomum, porque conseguimos arrastar à praça pública mais de  20.000 pessoas. Às vésperas do Natal, às 18 h. de um dia de semana, com  todo o comércio trabalhando. Isto tem um sentido muito elevado. Quando  terminamos o ato público, o Comandante da Polícia Militar da Bahia  chamou-me para uma campanha que ele estava iniciando. Qual era a  campanha? Ele colocou um pequeno adesivo em todos os veículos da Polícia  Militar e do Corpo de Bombeiros com a seguinte inscrição – “Este é o  Ano da Paz.”
São mais de 30.000 militares que em todos os veículos conduzem o adesivo  da Campanha, do Movimento Você e a Paz. Achei isso incomparável,  porque, normalmente, a polícia é repressiva. Com essa atitude do sr.  Comandante, estamos avançando para criar uma polícia educativa,  arrancando as raízes do mal, e não somente combatendo-lhe as  conseqüências.
Tivemos ocasião de dialogar com um grande traficante de drogas, de um  dos bairros mais perigosos de Salvador, que abandonou o hediondo  trabalho depois de ouvir-nos. Ele foi ouvir-me em uma escola, no seu  bairro, posteriormente na praça pública e comoveu-se. Quando eu desci do  palanque, ele me perguntou chorando: “E agora, o que eu faço da minha  vida?”
Respondi-lhe: “Vai trabalhar como qualquer cidadão.” E quanto vou  ganhar?” Eu respondi-lhe: “Um salário mínimo, porque você não sabe fazer  quase nada.” Ele riu, e respondeu-me : “Mas, isso eu ganho em alguns  minutos.” Redargui-lhe: “Com a morte da alma de muita gente, para muitos  anos, não é verdade? Somente que você não tem esse direito. Deus não  lhe criou para ser um criminoso de almas, porque o assassino comum mata o  corpo, mas o vendedor de drogas mata a alma, sendo um terrível covarde  que fica escondido, destruindo vidas, não sendo usuário, o que é ainda  mais perverso.”
Consegui-lhe o primeiro trabalho. Atualmente, está numa atividade  remunerada, é um cidadão e está tentando arrancar do ofício nefasto  outros traficantes, seus conhecidos. Porém, o mais fascinante é que nós  lançamos o Movimento “Você e a Paz” em Paris, no ano passado, em maio.  Lançamo-lo, também, em Portugal, em Coimbra, igualmente no ano passado, e  iremos apresentá-lo também em outros países. Aqui, no Brasil, já temos  uma grande quantidade de cidades que o estão realizando.  Lamentavelmente, o tempo de que disponho não me permite estar em todos,  mas já o temos no Paraná, em Santa Catarina, e vamos seguindo muito bem.
ER – Jesus orientou para se viver no mundo, sem ser do mundo. Podemos  identificar nessa orientação um convite para se viver em paz, apesar da  violência que cerca o homem?
Divaldo – Isto é o que Gandhi nos ensinava, seguindo o exemplo de Jesus.  Ele teve ocasião de dizer que lamentava muito os cristãos. Porque os  cristãos têm uma Bíblia de 400 páginas, que lêem, meditam e não lhes  adianta muito. Ele leu apenas o Sermão da Montanha, as doze linhas de  São Mateus e mudou a sua vida. Concluiu afirmando: “Eu amo a Cristo, mas  tenho muito medo dos cristãos, porque não respeitam o Cristo”. Como  conseqüência, ele elegeu a não violência, porque a não violência  proporciona paz. A pessoa não violenta é pacífica, é pacifista e é  pacificadora, porque no seu íntimo tem segurança.
Certa feita, um dos Secretários de Segurança Pública do Estado da Bahia  levou-me a um presídio da cidade para que eu realizasse uma palestra.  Colocou todos os criminosos em uma área amuralhada e assistidos por  policiais armados de metralhadora. Então, eu lhe disse: “Secretário,  como eu vou falar de paz e de amor com essas metralhadoras?” Ele  retrucou: “Divaldo, isto é para nossa segurança, porque é um risco aqui  estarmos. Temos que cuidar da nossa vida, pois que, do contrário,  poderemos ficar aqui seqüestrados.”
Respondi-lhe sorrindo: “Então o sr. sai e eu fico. Se eu irei falar  sobre a paz, tenho que acreditar nela. Se eu prego o amor, tenho que  confiar nele. É claro que eu não quero ficar aqui no Natal, seqüestrado.  Mas tenho que provar aos que irão ouvir-me, que não tenho medo deles ou  daquilo que os torna infelizes, graças à tranqüilidade que devo  possuir.”
Ele obtemperou: “Nós não podemos tirar a polícia”. Ao que eu sugeri:  “Mas, pelo menos, pode manter uma vigilância mais discreta”. Ele me  atendeu e eu comecei dizendo para os 200 encarcerados: “Vocês não estão  aqui obrigados. Fiquem se quiserem. Mas, antes de resolver se ficam ou  se saem, dêem-me dois minutos, exatamente dois minutos.” E contei-lhes  uma história de humor. Eles riram muito. A partir daí, expliquei-lhes:  “Agora, irei falar-lhes sobre algo mais sério, que merece reflexão.”
Fiquei muito tempo conversando com eles. Alguns começaram a ler as obras  espíritas, e criamos um núcleo dentro da Casa de Detenção. É necessário  que a nossa paz resista à perturbação de fora, porque senão é uma paz  ilusória. Jesus disse: “Eu vos dou a minha paz. Não como o mundo a dá,  mas como somente eu a posso dar.” Qual é a paz do Cristo? Sócrates  afirmava: “A consciência tranqüila, a palavra reta e os atos corretos.”  Quando estamos em paz mentalmente, não temos vergonha do passado, não  temos medo de acusações, podendo enfrentar as pessoas com tranqüilidade,  o que demonstra nossa paz. Pensemos, então retamente, falemos de  maneira correta e ajamos de forma saudável.
ER – Muitas são as pessoas que já têm consciência da necessidade de  conquistar virtudes. Reconhecem as suas ações equivocadas e a  necessidade de mudanças para conquistar a felicidade, mas não conseguem  mudar. O que você diria a essas pessoas que estão no propósito de mudar e  não conseguem?
Divaldo - Que insistam nos bons propósitos. Tudo são hábitos.Um grande  pedagogo disse: “Educar é criar hábitos saudáveis.” Quem não tem bons,  tem maus hábitos. Como estamos com hábitos arraigados, que chamamos  viciosos ou negativos, para instalarmos hábitos novos, deveremos  repeti-los até que se fixem. Se insistirmos nos bons hábitos, mesmo que  caindo para levantar, como diz o Evangelho, se tentarmos sempre criamos  uma nova adaptação, em breve, agiremos corretamente sem nos darmos  conta.
Como é que educamos a criança a falar corretamente? Ela diz a palavra  equivocada e corrigimo-la com a palavra certa. A criança sorri. Repete  errado. Voltamos a dizer certo. Automaticamente, se lhe inscreve na  mente o termo e, mais tarde, passa a falar corretamente. Nos atos morais  assim também ocorre. Allan Kardec, quando consultou os Espíritos,  conforme a questão 919, de O Livro dos Espíritos, perguntou-lhes: Qual o  meio prático mais eficaz que tem o homem de se melhorar nesta vida e de  resistir a atração do mal? E a resposta foi profunda: “Um sábio da  antiguidade já vo-lo disse: Conhece-te a ti mesmo”.
Fazer a viagem para dentro, para o íntimo, examinar os próprios limites,  ser humilde perante si mesmo, autoperdoar-se, constituem o caminho do  autoconhecimento. Todos temos o direito de errar, mas não o de  permanecer no erro. Temos que nos levantar. Cair é um fenômeno natural.  Todos caem. Ficar deitado, porém, é um fenômeno de acomodação.
Então, digamos aos corações amigos que pretendem mudanças, que essas  somente se dão pela repetição, pelo exercício, sem desânimo, até o  último instante.
Entrevista de Divaldo Pereira Franco ao Programa Televisivo O  Espiritismo Responde, da União Regional Espírita – 7ª Região, Maringá,  em 21.03.2007. 

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